“Mãe!” Significados e referências bíblicas 

“Mãe!” (2017), da direção de Darren Aronofsky, é uma obra para incomodar e promover discussões. Não é um filme para relaxar e assistir despretensiosamente. Admito que até a ficha cair demorou um pouco, pelo menos para mim. O início é arrastado, mas quando você percebe o que está acontecendo, cada minuto compensa. 

Este texto contém spoilers. Caso você não tenha ainda assistido ao filme, recomendo que pare a leitura aqui. 

As referências bíblicas foram surgindo aos poucos e o momento mais claro pra mim de que se tratava de uma alegoria ocorreu na cena em que o poeta (Javier Bardem) marca a testa de um dos seus leitores com tinta. Aquela imagem está tão ligada à Quarta-feira de Cinzas que não consegui imaginar mais em qualquer outra coisa além do Cristianismo. Com isso, quando o bebê nasceu, já tinha entendido que seria Jesus e não me surpreendi quando ele morreu nas mãos dos seguidores do pai dele. 

– A quebra da pedra e a morte do irmão 

Um acontecimento antes mesmo de a personagem da Jennifer Lawrence engravidar passou a fazer sentido depois que pesquei as referências bíblicas. 

O casal de hóspedes (Ed Harris e Michelle Pfeiffer), que invade o escritório do poeta – o cômodo proibido da casa -, representam Adão e Eva. Ela leva o homem até o local onde o Criador não permita a entrada de ninguém sem a sua presença. Lá, encostam e quebram o objeto mais precioso e querido do dono da casa, tal como Eva faz com que Adão coma a maçã da árvore proibida. O seguimento da história segue a mesma alegoria com a morte de um dos irmãos, tal como Caim e Abel. 

– O novo poema 

Depois das histórias do Antigo Testamento, chega uma nova era da vida do Criador. A partir do momento que a mulher engravida, ele escreve mais, o que pode ser interpretado como o Novo Testamento. A vinda de Jesus foi um divisor de águas e modificou a forma de muitas pessoas olharem o mundo. A ideia de sermos irmãos e compartilharmos as coisas fazem parte disso. Até mesmo quando o bebê morre, há a cena em que os seguidores do poeta comem seu corpo, assim como nós, católicos, comemos o corpo e bebemos o sangue de Cristo. 

No entendo, outro pensamento que também tive é que o novo poema do escritor pode ser a própria história a que estamos assistindo. Pode ser uma metalinguagem empregada ali. Afinal de contas, alguém pensou nessa história e criou aqueles personagens. O texto escrito pelo Criador pode ali no filme ser a própria história deles, o que de certa forma, se encaixa com a teoria de uma alegoria ao Novo Testamento. 

– A representação do mundo

As palavras dele se espalham e a população de seguidores surge em sua casa. Uma das cenas parecia claramente a imagem de um noticiário de protesto, ao mostrar conflito entre batalhão do choque e manifestantes. Houve música, explosões de guerra, mortes, fanatismo. Tudo o que existe e nos incomoda. Tudo o que queremos mudar, mas que foge do nosso alcance. Também queremos que parem. Entendi a dor da personagem gritando e clamando e ninguém a ouvindo. 

Nessa parte friso a crítica que o filme fez ao machismo. Chega a doer quando a mãe está sendo agredida devido a sua reação após a morte de seu filho. Os xingamentos são aqueles clássicos dirigidos às mulheres: vadia, puta, cachorra, etc. Vi um machismo também na forma como ela se portava diante do marido por meio da divisão de papéis entre eles. Ele escreve e ela arruma a casa. Depois, claro, entendemos que ela É a casa, o lar. Mas até chegar a esse ponto, ela foi retratada como a musa do poeta. 

– Ninguém ouve 

Isso tudo fez com que eu pensasse no quanto a humanidade está destruindo o mundo e parece que ninguém está ouvindo os chamados da natureza. A casa que estava sob reforma foi ficando cada vez mais danificada. As pessoas estavam derrubando e acabando com todo o trabalho da personagem. E não importava o quanto ela gritasse e pedisse, as pessoas continuavam abusando e utilizando suas coisas e roubando seus pertences. Ela tentou mostrar, mas quem poderia escutá-la? Quem está escutando? São furacões, terremotos e vulcões acontecendo e pessoas morrendo. Não seriam gritos pedindo o fim da destruição? 

– O trabalho como um parto 

Quando fazemos um trabalho que exige muito de nós, dizemos que foi “um parto”. Então acredito que essa também seja uma interpretação válida para explicar que a partir do momento que a inspiração do poeta engravidou, ele começou a escrever. Quando o trabalho foi concluído, ela deu à luz. Um trabalho importante é como um filho, é como algo que faz parte da gente, porque, afinal, é algo que veio de nós, saiu de nossas entranhas. Ao terminarmos, entregamos para o mundo aquilo que somos. E as pessoas fazem daquilo o que bem entenderem. (Desde fanfics até adaptações para o cinema, no caso de livros, por exemplo). As pessoas podem até mesmo destroçar a sua criação. Isso pode ser simbolizado na morte do bebê. (E que cena forte foi aquela!) 

“Mãe!” é provocativo e é um ótimo filme para ser visto e debatido. Você saí do cinema com vontade de conversar. Você olha pro lado e já quer falar com sua companhia: “Você entendeu o mesmo que eu?”. 

E vocês, o que entenderam depois de assistir a “Mãe!”? Deixe sua opinião nos comentários! 

Dois Irmãos e a violência como sinal de masculinidade

Nesse ano de 2017 foi lançada a minissérie Dois Irmãos, no canal Rede Globo. A produção é baseada na obra de Milton Hatoum, foi escrita por Maria Camargo e tem direção artística de Luiz Fernando Carvalho.

A produção técnica do programa, assim como a maioria das produções do canal, é incrível e digna de Hollywood. Da fotografia ao som, não há o que questionar. No entanto, o conteúdo, mais especificamente, o roteiro, não segue o mesmo caminho e perpetua esteriótipos que estão mais do que na hora de serem questionados e quebrados na programação brasileira.

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Sinopse: A história gira em torno de dois irmãos gêmeos idênticos, Omar e Yaqub, que têm personalidades conflitantes desde pequenos, e suas relações com a mãe (Zana), o pai (Halim) e a irmã (Rânia). Moram na casa da família a empregada Domingas e seu filho, Nael. O menino é quem narra, após trinta anos, os dramas que testemunhou calado. Do seu canto, ele vê entes da família de origem libanesa terem desejos incestuosos e se entregarem à vingança, à paixão desmesurada, em Manaus.

No primeiro capítulo, somos apresentados a Manaus, mais parecida com uma vila, em plena década de 20. Na trama, o personagem Halim (Bruno Anacleto) é apaixonado por Zana (Gabriela Mustafá) e, um dia, decide entrar no restaurante do pai desta e recitar um poema. Assim, com esse simples gesto, a menina se encanta e está decidida e a se casar com o moço.

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Halim (Bruno Anacleto) e Zana (Gabriela Mustafá)

Recentemente, vi uma crítica que dizia achar incrível que Zana avisa ao pai que irá se casar, como quem diz que vai na padaria. Porém, ao meu ver, eu questiono muito essa forma de romance, em que nada acontece e é só o rapaz declamar um poema para que a menina, considerada a mais linda da cidade, caia de amores. Eu amo poemas e poesias, mas convenhamos que ninguém se apaixona por alguém em três segundos, muito menos por causa de uma declamação , a não ser em filmes à la Disney.

A partir disso, os anos se passam e o casal está pronto para ter filhos. Na verdade, a mulher que exige filhos, já que o marido, não gostaria de ser pai. Assim, eles têm os gêmeos Omar e Yaqub, e se inicia toda a tragédia.

De acordo com o narrador, o filho “caçula”, Omar, nasceu muito fraco e quase morreu e, por isso, a mãe o cuidou com mais zelo e carinho, do que seu irmão. Por meio dessa preferência da mãe, surgiu uma relação de ciúme doentio dentro da família, do pai com os filhos e de Omar (o filho queridinho) com Yaqub (o menino calado).

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Os intérpretes de Omar e Yaqub, Lorenzo e Enrico Rocha, Matheus Abreu e Cauã Reymond.

Por meio disso, a história incita o ódio entre os irmãos o tempo todo, justificando a briga e violência destes, por causa de ciúmes e culpando todas as mulheres envolvidas. Ainda no capítulo 1, Omar, agora com uns 10 anos de idade, e Yaqub, se apaixonam por Lívia e esta, parece interessada nos dois. Não conhecemos nada da menina, ela simplesmente aparece para “provocá-los” e causar discórdia.

Na cena em que eles vão a exibição de um filme, na casa dos vizinhos, Yaqub beija Lívia e Omar, possuído pelo ciúme e ódio, quebra uma garrafa de vidro e corta o rosto do irmão. Zana, a mãe sofredora, não sabe lidar com a situação sem magoar um dos filhos e Halim, o pai bipolar, decide enviar o filho machucado para o Líbano, seu país de origem, por alguns anos.

Nesse trailer da série é possível ver a cena do corte.

O tempo passsa e a relação de Zana e Omar, agora confusa, com beijos no pescoço e pegadas por trás, fica mais forte e ambígua, enquanto Yaqub, volta, anos depois, mais quieto do que nunca e sem se sentir um membro da família. Ou seja, Yaqub, quem levou a cortada, que foi mandado embora e, exatamente ninguém, sentou para conversar com Omar e dizer que o que ele fez foi errado.

Por meio de narrativas assim, continuamos a ensinar aos meninos que quanto mais violento e dominador eles forem, mais eles provarão sua masculinidade. A mídia, seja televisão, cinema, internet, quadrinhos, etc, tem um papel essencial na construção de um indivíduo e quando mostramos cenas nesse estilo , crianças e adultos permanecem com a ideia estereotipada de masculinidade como forma de oprimir e dominar.

Além disso, a não ser pela personagem Zana, que é a mãe dos gêmeos, todas as mulheres mal falam e tampouco tem personalidade e histórias interessantes. A maioria aparece para saciar as vontades dos homens ou causar “discórdia” entre eles, o que me fez lembrar o texto que li no site groknation.com, “Porquê mulheres são vistas como puritanas ou putas?”.

Na imagem, a personagem Lívia, mais conhecida como a “causa” da discórdia entre os irmãos.

Segundo uma das colaboradoras do groknation*, Sa’iyda Shabazz, “As duas primeiras imagens de mulheres foram ou a Virgem Maria ou Maria Madalena, uma prostituta que buscava a redenção de Jesus. Quando somente há duas únicas visões de mulheres, desde os primórdios, como é que se supõe que iremos passar adiante disso? […] Nós ainda preferimos manter as mulheres ao padrão da mãe virgem, porque é mais seguro, do que ver as mulheres como pessoas totalmente formadas que podem desfrutar de algo como o sexo, sem motivos de procriação.” (Tradução livre)

Outro detalhe interessante é vermos as cenas de Zana e Rânia, sua filha, numa eterna disputa de poder e beleza, além de que, conforme a própria narração diz sobre a mãe: “ao envelhecer, Zana perde sua beleza para a filha”. Enquanto jovens, somos lindas, quando envelhecemos, somos esquecidas e rechaçadas e, claro, a disputa entre mulheres não foge nem dentro da família. Nao sei aonde iremos parar com esses “ensinamentos”.

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Zana, interpretada por Gabriela Mustafá, Juliana Paes e Eliane Giardini.

E o quê falar da personagem Domingas (Zahy Guajajara)?

Quando criança, ela fica órfã e é entregue à Zana, como um presente, para servir como empregada doméstica, mas, na verdade, ela se torna uma escrava. O próprio narrador, que é seu filho, comenta “Domingas é meio ãma, meio escrava”. Meio não, ela é escravizada, humilhada e abusada o tempo todo. Inclusive, a personagem é estuprada pelo gêmeo Omar e NINGUÉM comenta o assunto e a jovem ainda é humilhada, quando anda com seu filho pela cidade, chamada por nomes horríveis, até mesmo pela “patroa”, que diz não querer “um filho de ninguém” em sua casa.

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Domingas (Zahy Guajajara).

Será que ninguém percebe o quão errado é isso? No momento em que uma das personagens é humilhada, estuprada, abusada, e não tem sequer voz e história por trás, fica a entender de que ela pertence à família e eles podem fazer o que quiserem com ela, especialmente os homens. Esse tipo de história concretiza a ideia de que nós, mulheres, somos meros objetos de prazer masculino. E não, nós NÃO somos! Sem contar que, também remete à ideia de que índios são inferiores, sendo justificável os brancos, no caso, libaneses, escravizá-los.

Para piorar, as outras mulheres, maioria negras ou estrangeiras, aparecem quando Omar quer transar ou quando quer provocar sua família, em particular sua mãe, que insiste em humilhar as moças, as chamando de vadias e destruidoras de lares, passando a mão na cabeça do filho, que estupra, abusa e soca quem ele quiser, sem nunca ser punido.

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O filho quem leva a “destruidora de lares” para casa e ela quem é humilhada e expulsa do lugar.

Por fim, entendemos que a redenção de Omar acontece, quando seu filho, Nael, vindo de um estupro, estende suas mãos ao “pai”, querendo ouvi-lo dizer perdão. Infelizmente, Omar, assim como a maioria dos homens, que usam e abusam de sua “masculinidade”, nunca assume e, talvez, nem entenda seus erros, enquanto, Domingas são esquecidas e jogadas ao mar. É simplesmente cansativo vermos minisséries como esta, em que os homens seguem esse padrão de violentar quem eles bem quiserem para provar seu lugar como macho alfa e nunca serem reprimidos ou punidos por seus crimes.

Até quando insistiremos em histórias assim?

Ano passado, tivemos o prazer de assistir Justiça que, mesmo tendo histórias tristes e pesadas, deu um show de humanidade. Então por que não vemos mais programas como este, ao invés de Dois Irmãos, que somente investe em misoginia, preconceito, ódio e mais ódio? O que estamos querendo passar aos nossos meninos/homens e o que estamos dizendo sobre nossas meninas/mulheres?

Para refletir sobre o assunto, indico o documentário the Mask You Live In , abordado pela Louise Queiroga, no texto “A máscara que os meninos usam”, em que a autora diz O filme aborda como a masculinidade é socialmente construída e o quanto isso fere a forma de como os homens poderiam se expressar”. Ademais, o doc ainda mostra como a mídia influência no desenvolvimento de caráter de uma pessoa.

Sendo assim, uma produção que tinha tudo para ser extraordinária, acaba ferindo as mulheres e perpertua a educação machista de nossa sociedade. Uma das coisas que salva o programa, é a maravilhosa interpretação de Juliana Paes e Eliane Giardini, mas, até mesmo a primeira, quando elogiada, tem seu corpo e nudez glorificado e o talento velado.

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As primeiras notícias do Google, ao pesquisar sobre a atriz na minissérie, são sobre as cenas em que ela aparece nua.

*groknation.com: é o site da atriz e neurocientista Mayim Bialik, mais conhecida pelo papel de Amy Farrah Fowler, na sitcom americana The Big Bang Theory.

BIBLIOGRAFIA:

GROKNATION. FEMINISM 101: WHY ARE WOMEN ONLY SEEN AS “PRUDES” OR “SLUTS”?. 2017. Diponível em: <http://groknation.com/women/feminism-101-why-are-women-only-seen-as-prudes-or-sluts/&gt;. Acesso em: 22 de jan. 2017.

GSHOW.‘Dois Irmãos’: conheça a história da nova minissérie da Globo. 2017. Disponível em: http://gshow.globo.com/tv/noticia/2016/11/dois-irmaos-conheca-historia-da-nova-minisserie.html&gt;. Acesso em: 22 de jan. 2017.

WIKIPEDIA. Dois Irmãos. 2017. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Dois_Irmãos_(minissérie)&gt;. Acesso em: 22 de jan. 2017.

This is US: o mais novo amor em forma de série.

Representatividade importa e muito. Esse assunto tem sido o tópico de muitos textos, não só do Projeto Nellie Bly, como vários outros blogs, de pessoas que estão cansadas das mesmas histórias, com o mesmo tipo de protagonista, como se o mundo não tivesse a diversidade que tem.

No entanto, essa luta não é só do público, na verdade, existem pessoas no mercado que entendem essa demanda, pois fogem ou também se cansam do padrão, e estas pessoas nos presenteiam com trabalhos incríveis. Este texto é justamente sobre uma das mais recentes séries dramáticas americanas, que o público ganhou e MUITO.

This is US

Trailer da série.

Série criada por Dan Fogelman e exibida pelo canal NBC, lançada em 2016.

Sinopse: Rebecca Pearson teve uma gravidez difícil de trigêmeos. O nascimento dos filhos aconteceu no dia em que seu marido, Jack Pearson, completava 36 anos. A vida de Rebecca, Jack e seus três filhos – Kevin, Kate e Randall – são apresentadas em diferentes fases. As histórias de Rebecca e Jack geralmente ocorrem durante a fase inicial do casamento, em torno do nascimento das três crianças ou em diferentes etapas da educação destas. Além disso, seguimos as narrativas de Kevin, Kate e Randall, quando estes tem exatamente 36 anos, cada um com sua própria bagagem. Assim, presenciamos essas tramas, todas conectadas entre si, não só pelo laço familiar, mas pelo emocional.

No piloto da série, já é possível entender a ligação de todos os personagens e perceber que, as histórias mostradas, se passam em épocas diferentes e isso é o charme de This is Us. Tudo começa com Rebecca (Mandy Moore), comemorando o aniversário do marido, Jack (Milo Ventimiglia), e antes que ela pudesse finalizar sua dancinha sensual, sua bolsa estoura e eles correm para o hospital.

Ao mesmo tempo em que conhecemos o casal, somos apresentados à novos personagens, que vivem situações separadas, mas todos estão interligados, pois fazem parte da mesma família. Decidi falar de casal em casal, porque é muito amor para uma série só e todos merecem uma chance de brilhar.

1) Rebecca e Jack Pearson.

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Rebecca Pearson (Mandy Moore) e Jack Pearson (Milo Ventimiglia)
O casal central deste novo drama tem uma linha narrativa muito intrigante. A vida deles se passa nos anos 70, às vezes pulando décadas, mas, no começo, é sobre a etapa de vida em que eles são pais de trigêmeos. Primeiro que, no dia do parto, o casal já sofre uma das maiores perdas possíveis e, de alguma forma, a vida dá uma oportunidade pra eles, de passar e superar essa dor, justamente através do amor.

Além disso, acho maravilhosa a relação deles, pois cada um lida de uma forma diferente com tantas mudanças na vida e, sempre quando achamos que eles vão surtar e ter um problema, o casal consegue fazer o que a maioria dos casais se esquecem: conversar. A partir disso, um consegue compreender o lado do outro e vemos como eles vão amadurecendo, juntos, com todas as dificuldades, ganhos e perdas, e o público se envolve com essa relação fofa.

Aliás, outro fato interessante é que Rebecca deixa bem claro que não será mãe sozinha. Como a história se passa nos anos setenta, normalmente vemos o pai trabalhando e voltando pra casa, enquanto a mãe toma conta dos filhos e do lar. Porém, já nos primeiros episódios, a personagem se impõe, dizendo que não vai aceitar isso e que espera uma atitude de pai, em relação ao Jack, e, por incrível que pareça, ao invés de se irritar ou dizer que ele é quem trás o dinheiro pra casa, ele entende as questões da mulher e seu dever como marido e pai e assume isso pra si. Como não faltam reviravoltas nessa série, é importante falar que estou me referindo somente ao início da relação deles.

2) Beth e Randall Pearson.

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Beth Pearson (Susan Kelechi Watson) e Randall Pearson (Sterling K. Brown)
A sequência do casal Beth e Randall se passa nos dias atuais, já casados e com duas filhas pequenas. No entanto, como grande parte desta trama tem a ver com Randall em busca de seu verdadeiro pai, volta e meia, o programa mostra essa narrativa no passado, para entendermos como este foi abandonado pelo pai biológico e adotado pela família de Rebecca.

Primeiro que o Randall é um fofo, que abraça tudo e todos. Eu me surpreendo muito com as atitudes dele e com seu sofrimento, de tentar achar respostas, sem magoar ninguém e me encanto, pois, infelizmente, acaba sendo diferente vermos personagens masculinos com tanta sensibilidade, quando, na verdade, era o tipo de representatividade que mais precisamos para acabar com esse esteriótipo de que homem tem que gritar, provar que é machão e nunca chorar.

Segundo que a mulher dele é incrível. Ela é a mentora dele, ao mesmo tempo em que ela precisa se achar e se impor no meio dessa busca do marido, pelo pai biológico. Aliás, a grande sacada dessa série é justamente um personagem ser o mentor do outro. Acho incrível essa troca de conhecimento, pois todos temos muito o que apender e ensinar, também.

Por fim, é bastante interessante vermos a infância e juventude dele, quando este sofria preconceito na escola por ser negro e adotado, e toda a dificuldade que Randall passa, às vezes recebendo o apoio da família, outras, sendo negado por esta, como é o caso de seu irmão, Kevin, que também reproduzia os preconceitos da sociedade.

3) Kate e Kevin Pearson.

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Kate Pearson (Chrissy Metz) e Kevin Pearson (Justin Hartley).
Kate e Kevin são irmãos gêmeos, do tipo que conseguem sentir a dor física do outro, mesmo estando a quilômetros de distância. Talvez, essa seja minha trama preferida, porque vemos Kevin, um ator famoso, lindo e rico, irritado com o último papel que conseguiu e buscando novas oportunidades, sendo divertido assistir um homem branco objetificado na sitcom em que trabalha e magoado com isso. Quem sabe assim, alguns homens entendam o quão cansativo e vazio é pra nós, mulheres, quando atuamos ou vemos isso acontecendo com a maioria dos personagens femininos.

Além disso, Kate trabalha para o irmão, mas tem seu drama pessoal, que é sua dificuldade em se aceitar, devido ao seu peso. Ela inicia uma terapia em grupo, onde conhece Toby Damon (Chris Sullivan), um cara que enfrenta os mesmos problemas que esta e, pela primeira vez, ela consegue assumir o protagonismo em sua vida e não mais viver às sombras do irmão. Eu não consigo deixar de me apaixonar pela Kate, toda vez que ela entra em cena e dá um show de talento e sensibilidade, nos provando que ela tem tanto brilho quanto o irmão.

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Sua linda!
Aliás, essa história é emocionante, não só por dar voz a uma personagem que, normalmente, é o alívio cômico* das séries, mas, porque, assim como ela, posso me identificar com a dificuldade em conseguir achar seu espaço nesse mundo machista e padronizado, que costuma dar voz aos “Kevins” que existem.

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Poster da série.
This is US está na primeira temporada, sendo que já foi renovada para mais duas e levou o prêmio de melhor série dramática estreante no People’s Choice Awards* 2017. Isso não é mera coincidência e, sim, devido à maravilhosa forma como o roteiro nos guia, nas dores pessoais de cada um, além de seguir um dos temas mais prestigiados da televisão: família.

Sentimos, através da história, dos diálogos e dos atores, a dificuldade de cada um, nos simpatizando e nos identificando, como humanos. Claro que cada um tem um problema diferente, uns com assuntos mais pesados, outros menos, mas todos com dores e sofrimentos, aos quais podemos ter empatia e entender cada vez mais, o que é estar na pele de uma pessoa diferente de você.

Assim, prepare seu coração e guarde um horário na semana, para começar a maratona e se emocionar e encantar com novos pontos de vista dentro de uma produção televisiva.

BÔNUS DO DIA

Como de costume, sempre coloco um “bônus” nos meus textos e nesse não seria diferente. Eu posso estar ficando maluca, mas não consigo assistir ao programa, sem comparar Mandy Moore, no papel de Rebecca Pearson mais velha, com a Diane Keaton e lembrar do filme, em que elas fizeram papel de mãe e filha, Minha mãe quer que eu case (2007).

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Mandy Moore como Rebecca Pearson mais velha.

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Diane Keaton.
Ok, talvez nas fotos não pareça tanto, mas juro que na série elas se assemelham bastante e lembrar de Diane Keaton é sempre um amorzinho, né?

VAI LOGO ASSISTIR ESSA SÉRIE!

*alívio cômico: é a inclusão de um diálogo, cena ou personagem humorístico, para quebrar situações de drama ou suspense.

*People’s Choice Awards: premiação norte-americana voltado ao cinema, música, televisão e, mais recentemente, internet, aonde o público é quem vota nos seus favoritos.

BIBLIOGRAFIA

ADOROCINEMA. Veja a lista completa de vencedores do People’s Choice Awards 2017. 2017. Disponível em: <http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-127157/&gt;. Acesso em: 19 de jan. 2017.

IMDB. This is Us. 2016. Disponível em: <http://www.imdb.com/title/tt5555260/&gt;. Acesso em: 19 de jan. 2017.